28 de fev. de 2016

ECOTEOLOGIA


Então, formou o SENHOR Deus ao homem do pó da terra e lhe soprou nas narinas o fôlego de vida, e o homem passou a ser alma vivente. Gênesis 2.7



OBJETIVO

Trataremos nesse sermão sobre o estudo de uma Teologia integrada ao ecossistema dentro do plano original de Deus.

INTRODUÇÃO

O que seria uma Teologia integrada ao ecossistema que se orienta na proposta original do Éden? Qual é a proposta original de Deus para o mundo e o ser humano? São perguntas que discorreremos nos textos a seguir:
Ecologia etimologicamente tem a ver com casa, morada (grego: oikos). Cuidar de nossa morada, repará-la e adaptá-la às eventuais novas ameaças,alargá-la para abrigar novos seres culturais e naturais, eis uma tarefa humana e também sua missão.
E plantou o SENHOR Deus um jardim no Éden, na direção do Oriente, e pôs nele o homem que havia formado. Gênesis 2.8
A original proposta divina é que o ser humano pudesse contemplar o jardim do Éden plantado por Deus como modelo e o estendesse nesse padrão até os confins da terra. Compare o pensamento com esse versículo:
E Deus os abençoou e lhes disse: Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todo animal que rasteja pela terra.Gênesis 1:28
Assim o Reino de Deus seria expandido nessa terra através de uma gestão eficiente e sustentável em todos sentidos: físico, psíquico, social, econômico e, principalmente, o espiritual.
Cujo resultado de todos os esforços e ações humanas rendesse louvor a Deus através da expansão de seu reino para sua exclusiva glória.
a fim de sermos para louvor da sua glória, nós, os que de antemão esperamos em Cristo; Efésios 1.12a
Assim, o propósito de Deus estava em formar um ser humano biopsicoespiritual integrado ao seu sentido existencial e a seu propósito pessoal.
nele, digo, no qual fomos também feitos herança, predestinados segundo o propósito daquele que faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade, Efésios 1.11
Observe que existem detalhamentos para a plenitude da missão humana, com o cumprimento do “sentido existencial” humano faz com que ele “se realize como ser”; igualmente, o cumprimento de seu “propósito” faz com que ele se “realize como pessoa”; também, o cumprimento de sua “vocação” faz com que ele se realize como “indivíduo ou cidadão”; destarte, o cumprimento de seu “chamado” faz com que ele se realize como “cristão”; por fim, o cumprimento de seu “ministério” faz com que ele se realize como “ser espiritual, como adorador”!


ANÁLISE E CARACTERÍSTICAS
Como premissa básica no cumprimento do sentido existencial e do propósito pessoal do ser humano; Ele como, “ser biopsicoespiritual”, criado por Deus, deveria estar em harmonia com o ambiente em que vive, quer nas esferas terrena, psíquica, social, econômica e espiritual.
CONSIDERAÇÕES GERAIS.
Destarte, pecado e doença não podem ser considerados apenas como transgressões de âmbito espiritual; mas, como quebra harmônica de qualquer uma dessas áreas ou esferas, observe isso:


  1. O FÍSICO
O ser humano foi constituído em seu aspecto físico, do pó da terra (Gn.2.7) e, como tal, seu corpo deve estar em equilíbrio com os elementos químicos ingeridos, com os alimentos e com a natureza, ou seja, integrado ao seu meio ambiente.
Embora, saibamos que existam enfermidades de cunho espiritual, contudo, quando o corpo do ser humano não está em equilíbrio também podem surgir doenças físicas.  
Exemplo: Evitar o excesso dos cinco produtos brancos processados: Sal (hipertensão), açúcar (diabetes), farinha (trigo - celíase) (amido - obesidade), leite (lactose)...
Portanto, quem não dá o devido cuidado para seu corpo e para sua saúde também está em pecado!
Não sabeis que sois santuário de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós? Se alguém destruir o santuário de Deus, Deus o destruirá; porque o santuário de Deus, que sois vós, é sagrado. 1Co 3.16-17.
PASSOS PARA RESTAURAR ESSA  ÁREA:
- Boa alimentação, saudável e balanceada.
- Prática regular de exercícios físicos.
- Cuidado com a higiene em todos sentidos.
- Estabelecimento de mecanismos de cuidados e segurança na manutenção do corpo e da existência.


2. O PSÍQUICO.
Quando o ser humano não está em harmonia consigo mesmo surgem os conflitos pessoais. A incapacidade humana de gerir seus sentimentos associado com o desequilíbrio emocional e a desordem cognitivo comportamental deflagram às mais variadas formas de doenças psíquicas como: depressão, neurose, mania, obsessão, compulsividade, esquizofrenia, etc.
Uma em cada cinco pessoas sofre ou sofrerá de algum tipo importante de distúrbio emocional.
Da mesma forma, quando o ser humano não está em harmonia social surgem os conflitos interpessoais. As contendas, as discussões, as injustiças, as iniquidades, a sociopatia, a criminalidade, a interdição, a detenção e o confinamento.
Portanto, quem não dá o devido cuidado para seu “bem estar” e para sua saúde mental também está em pecado! Ainda que substitua esse período de qualidade com obras de religião.
Ora, se alguém não tem cuidado dos seus e especialmente dos da própria casa, tem negado a fé e é pior do que o descrente. 1 Timóteo 5.8
PASSOS PARA RESTAURAR ESSA  ÁREA:
- Ministrações de Cura Interior.
- A prática da Cura nos Relacionamentos através do perdão e do sangue de Jesus Cristo.
- O aprendizado sobre como ser educado de forma socioemocional.
- A manutenção do cuidado para com a saúde emocional, bem como, o respeito para com os limites emocionais de qualquer indivíduo.


3. O MEIO AMBIENTE.
Estas preocupações estão originando uma cultura ecológica, quer dizer, a consciência coletiva da responsabilidade dos seres humanos pela sobrevivência não só do indivíduo e da humanidade, mas do planeta, das espécies animais e vegetais, responsabilidade na superação da miséria e da pobreza social no mundo, pelas relações que devem permitir vida para todos e um bem estar dos seres humanos e de todos os seres da natureza.
Hoje temos consciência de que o social é parte do ecológico no seu sentido amplo e verdadeiro. Ecologia tem a ver com as relações de tudo com tudo em todas as dimensões. Tudo está interligado. Quando o ser humano não está em harmonia com a natureza surge a destruição ambiental, a exploração corrosiva, a poluição e o caos global.
Isso vai além de mero pensamento sobre conservacionismo, preservacionismo ou ambientalismo; mas tem a ver com e sim uma ecologia social: "é o estudo dos sistemas humanos em interação com seus sistemas ambientais".
O Ser humano foi criado com poder para interferir nos ritmos da natureza. Tudo isso o torna um ser responsável. É a responsabilidade que o faz um ser ético. Pode se sentir o um bom mordomo da natureza, seu guardião, herdeiro responsável pela herança que recebeu do Criador. Como pode se comportar como satã da terra, destruir, quebrar equilíbrios e devastar espécies de seres vivos e até seus semelhantes.
Sim! Quem não cuida do meio ambiente também está em pecado. Porque tal indivíduo, como cidadão e como sociedade, prestará contas a Deus por  destruir a sustentabilidade da terra, a qual, Deus a conferiu através da mordomia.
Teologicamente podemos falar de pecado ecológico. Quer dizer, daquelas atitudes que comprometem o equilíbrio ecológico e a evolução e que provocam consequências perversas para os seres vivos e para os humanos.
Esse pecado ecológico não se restringe apenas ao presente. Ele alcança o futuro, pois podem ser feitas intervenções na natureza cujas consequências se prolongam para além da geração atual, atingindo aqueles que ainda não nasceram. O preceito bíblico: "Não matarás"( Ex. 20.13) abarca também o biocídio e o ecocídio futuros. Não nos é permitido criar condições ambientais e sociais que produzam futuramente doenças e mortes aos seres vivos, humanos e não humanos. O pecado ecológico é um pecado geracional, social e histórico.
PASSOS PARA RESTAURAR ESSA  ÁREA:
Adoção por uma estilo de vida sustentável.
Adesão na educação da sociedade como um todo, cuja conscientização leva ao cuidado do OIKOS (Nossa terra, nossa casa).
A disposição para um estilo de vida que valoriza a contemplação da Glória de Deus!
Com dimensões contempláveis (o que se pode contemplar, vislumbrar, apreender), quero me referir aos aspectos da transcendência, bem como, da noção de numinoso, ou seja: Sentimento numinoso é um estado afetivo da alma que só pode ser provocado, excitado, despertado no espírito humano, pela simpatia, pela participação sentimental em relação ao próprio numinoso, o “mysterium tremendum et fascinans”. O sentimento numinoso não  pode, em última análise, ser ensinado, não pode ser transmitido, e se refere exclusivamente à divindade.
E clamavam uns para os outros, dizendo: Santo, santo, santo é o Senhor dos exércitos; a terra toda está cheia da sua glória. Isa 6.3.


4. O ECONÔMICO
O filósofo Gilles Lipovetsky no livro, Os tempos Hipermodernos, trabalha com o conceito da hipermodernidade em suas múltiplas facetas do individualismo contemporâneo, o consumo de massa, culto do desenvolvimento pessoal, etc. Ele define “Hipermodernidade” com “uma sociedade liberal, caracterizada pelo movimento, pela fluidez, pela flexibilidade; indiferente como nunca antes se foi aos grandes princípios estruturantes da modernidade, que precisaram adaptar-se ao ritmo hipermoderno para não desaparecer.
E de fato, essa hipermodernidade revela toda sua crueldade a medida que na forma atual e liberal de trabalho faz com que o indivíduo viva com o foco mais em aspectos objetivos, aspiracionais e funcionais do que do ponto de vista ôntico, isto é, na valorização da carreira ao invés do indivíduo. Na prevalência do ter versus o ser.
Isso faz que do ponto vista econômico, o cidadão não possua um trabalho, e sim, seja escravo de seu trabalho; ele não está sobre o senhorio de seu dinheiro, mas é seu dinheiro e seu valor de consumo que o possui.
Quando o ser humano não está em harmonia com sua economia (Grego: Oikónomos), isto é, do cuidado da gestão de sua casa, surge o pecado de infidelidade econômica, da negligência do dízimo e das ofertas, do pecado da ostentação, do desperdício, da injustiça econômica e social, da exploração do trabalho e de outros indivíduos, etc.
Como servo contratado de ano em ano, estará com o comprador; o qual não dominará sobre ele com rigor diante dos teus olhos.  Lv.25.53.
PASSOS PARA RESTAURAR ESSA  ÁREA:
- O arrependimento pela negligência financeira.
- O pagamento de suas dívidas.
- Aplicação de uma boa gestão econômica.
- Adoção por um estilo de vida que não contemple a vaidade e a instabilidade da paixão pelas riquezas.

6​ Todos os servos que estão debaixo de jugo considerem dignos de toda honra o próprio senhor, para que o nome de Deus e a doutrina não sejam blasfemados. Também os que têm senhor fiel não o tratem com desrespeito, porque é irmão; pelo contrário, trabalhem ainda mais, pois ele, que partilha do seu bom serviço, é crente e amado. Ensina e recomenda estas coisas...Porque nada temos trazido para o mundo, nem coisa alguma podemos levar dele. Tendo sustento e com que nos vestir, estejamos contentes. Ora, os que querem ficar ricos caem em tentação, e cilada, e em muitas concupiscências insensatas e perniciosas, as quais afogam os homens na ruína e perdição. Porque o amor do dinheiro é raiz de todos os males; e alguns, nessa cobiça, se desviaram da fé e a si mesmos se atormentaram com muitas dores. 1 Timóteo. 6.1,2; 7-10.


5. O ESPIRITUAL.
Quando o ser humano não está em harmonia com seu espírito e com Deus surge o pecado, a queda, o juízo e a condenação final.
De fato, isso sabemos desde o texto que trata sobre a queda humana e sua respectiva morte espiritual.
16  Ordenou o Senhor Deus ao homem, dizendo: De toda árvore do jardim podes comer livremente; 17  mas da árvore do conhecimento do bem e do mal, dessa não comerás; porque no dia em que dela comeres, certamente morrerás. Gn.2.16,17.
1  Ele vos vivificou, estando vós mortos nos vossos delitos e pecados, 2  nos quais outrora andastes, segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe das potestades do ar, do espírito que agora opera nos filhos de desobediência, 3  entre os quais todos nós também antes andávamos nos desejos da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos; e éramos por natureza filhos da ira, como também os demais. 4  Mas Deus, sendo rico em misericórdia, pelo seu muito amor com que nos amou, 5  estando nós ainda mortos em nossos delitos, nos vivificou juntamente com Cristo (pela graça sois salvos), 6  e nos ressuscitou juntamente com ele, e com ele nos fez sentar nas regiões celestes em Cristo Jesus, 7  para mostrar nos séculos vindouros a suprema riqueza da sua graça, pela sua bondade para conosco em Cristo Jesus. Ef.2.1-7.
Logo, quem negligencia sua vida espiritual prestará contas a Deus, por seu esfriamento na fé.
PASSOS PARA RESTAURAR ESSA  ÁREA:
- O arrependimento dessa negligência é o primeiro passo para restauração espiritual.
- A confissão de pecados é o critério estabelecido por Deus para que haja perdão de pecados.
- A Oração de confissão e conversão que conduz uma prática contínua de vida de oração a Deus.
- A proposta em assumir a Adoração como forma espontânea e contemplativa em Deus como estilo de vida.
- Constante Meditação na Palavra de Deus como modo e regra de fé prática de vida crista no crescimento espiritual.


CONCLUSÃO:

Portanto, Deus requer que vivamos uma vida integrada com sua vontade em nosso biopsicoespiritual cuja nossa existência glorifique a Deus em todos os sentidos.
17  Mas graças a Deus que, embora tendo sido servos do pecado, obedecestes de coração à forma de doutrina a que fostes entregues; 18  e libertos do pecado, fostes feitos servos da justiça. 19  Falo como homem, por causa da fraqueza da vossa carne. Pois assim como apresentastes os vossos membros como servos da impureza e da iniqüidade para iniqüidade, assim apresentai agora os vossos membros como servos da justiça para santificação… 22  Mas agora, libertos do pecado, e feitos servos de Deus, tendes o vosso fruto para santificação, e por fim a vida eterna. Rom.6.17-19,22.


APELO

Quantos querem servir a Deus de forma harmônica em toda sua integralidade, isto é, em seu espírito, alma e corpo. Porque exercer ministério social é ajudar o indivíduo em sua integralidade?

20 de fev. de 2016

A IGREJA PRIMITIVA E A ASSISTÊNCIA SOCIAL

“Aconteceu, depois disto, que andava Jesus de cidade em cidade e de aldeia em aldeia, pregando e anunciando o evangelho do reino de Deus, e os doze iam com ele, 2  e também algumas mulheres que haviam sido curadas de espíritos malignos e de enfermidades: Maria, chamada Madalena, da qual saíram sete demônios; 3  e Joana, mulher de Cuza, procurador de Herodes, Suzana e muitas outras, as quais lhe prestavam assistência com os seus bens.”. Lc.8.1-3.
OBJETIVO.
O presente sermão procura descrever a importância das atividades de assistência social no âmbito da igreja primitiva e de que forma essas atividades podem servir de referência a igreja atual.
INTRODUÇÃO.
Destacamos fundamentalmente o testemunho solidário e assistencial que predominava como “marca do cristianismo” nos primeiros séculos, bem como descrição de suas formas de solidariedade praticadas pelo mesmo no decorrer destes anos; entre eles: o batismo, o ágape, o socorro nas epidemias, a hospitalidade, caixa comunitária, coletas, o sepultamento e o testemunho da diaconia.
Todo princípio solidário baseava-se no seguinte versículo:
Criou, pois, Deus o homem à sua imagem; à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou. Gn.1.27.
Ora, se todo ser humano é a imagem e semelhança de Deus, logo é um dever cristão impedir que a imagem de Deus seja desconsiderada no tratamento de sua dignidade. Portanto, a assistência ao necessitado é uma forma de glorificar a Deus cuidando de sua imagem e semelhança.   
DESCRIÇÃO:
  1. BATISMO:
Indubitavelmente, o batismo é um dos sacramentos mais importantes da história da Igreja; tinha função de incorporar novos membros à mesma. Os candidatos ao batismo recebiam instruções éticas e práticas em relação à fé cristã (catequese/discipulado); tal candidato era apresentado por um membro da comunidade chamado “padrinho ou madrinha” ao catequista que o instruía aos princípios éticos da vida cristã como: cuidar dos pobres, amparar o órfão, a viúva, etc. Uma vez recebidos, podiam participar dos ágapes, porém não da “Santa Ceia”, a qual só participava quando fosse devidamente aprovado e aceito como cristão autêntico na comunidade.
Os cristãos não agiam de forma improvisada, mas organiza a comunidade,distribuindo as tarefas entre os membros, de acordo com o que cada um sabia fazer melhor.
2. SANTA CEIA:
Outro dos cerimoniais mais importantes da igreja primitiva era o ágape; o qual se tratava de um jantar comunitário administrado pelos diáconos que representava comunhão cristã tanto no cerimonial de Cristo (eucaristia ou Santa Ceia) quanto cumpria com uma função social que visava o suprimento daqueles cristãos mais necessitados com seu alimento diário entre a comunidade da fé.
Os membros da comunidade traziam alimentos e outros bens para partilhar entre os demais, com o objetivo de suprir os irmãos necessitados. Quem tinha mais, trazia mais. Dos alimentos trazidos, separava-se o pão e o fruto da videira pelo qual se dava graças, com vistas à celebração da Ceia do Senhor.
O termo comunhão [Koinonía] refere-se à prática da partilha de bens. Esta prática se fazia necessária, dada a realidade de que a grande maioria dos membros se constituía de pessoas pobres. No caso da comunidade de Jerusalém, a maioria se constituía de escravos, diaristas, mendigos, artesãos.
Nessa função social, a comunidade acolhia e dava suprimento àqueles irmãos que realizavam viagens ministeriais. Com o passar do tempo, houve a separação do ágape e do sacramento da Santa Ceia, perdendo, portanto, o ágape o aspecto sacramental e a eucaristia o aspecto social.
3. O SOCORRO NAS EPIDEMIAS:
Uma característica cristã era o socorro nas epidemias; prática exclusiva do cristianismo naquele período que dava assistência aos enfermos sem distinguir se eram cristãos ou não; tais auxílios nos períodos de pragas e mortandades colheram muitos cristãos vitimados pela peste, porém faziam um serviço comunitário que recebia louvor até dos pagãos; assim mesmo desconhecendo a solução do problema detinham a proliferação das próprias epidemias.
O bispo Dionísio de Alexandria(falecido em 265) escreve sobre a peste que atingiu sua cidade e relata que os cristãos cuidaram dos doentes, sem fazer distinção entre cristãos e nãocristãos. Segundo seu relato, os pagãos fugiam das pessoas infectadas, inclusive dos seus familiares, abandonavam os moribundos e deixavam os mortos jogados. Muitos cristãos morreram nesses cuidados, inclusive presbíteros, leigos e diáconos. Tomavam os moribundos no colo e no momento da morte “fechavam-lhes os olhos e a boca”. Preparavam os corpos com banho e os enterravam, e muitas vezes, os sucediam na morte (Eusébio, História Eclesiástica VII, 22, p. 467-470).
4. A HOSPITALIDADE:
A hospitalidade era outra prática comum naquele período, cujos cristãos abriam seus lares como locais de encontro e convívio da grei, gerando nisto expansão da comunidade e apoio solidário em abrigo até que tal indivíduo conseguisse trabalho e assim auxiliasse a outros. Se alguém estivesse de passagem, a hospitalidade instruía a proporcionar alimento até o próximo destino.
42  Porque tive fome, e não me destes de comer; tive sede, e não me destes de beber; 43  sendo forasteiro, não me hospedastes; estando nu, não me vestistes; achando-me enfermo e preso, não fostes ver-me. 44  E eles lhe perguntarão: Senhor, quando foi que te vimos com fome, com sede, forasteiro, nu, enfermo ou preso e não te assistimos? 45  Então, lhes responderá: Em verdade vos digo que, sempre que o deixastes de fazer a um destes mais pequeninos, a mim o deixastes de fazer.Mt.25.42-45.
5. CAIXA COMUNITÁRIA:
A caixa comunitária (deposita pietatis) era outra característica de solidariedade cristã que proporcionava apoio e conforto material e espiritual. Tal gesto consistia em uma partilha voluntária dos bens ocorrida nos ágapes pela administração dos diáconos para a grande maioria de cristãos que se constituía da classe mais pobre da sociedade (patrimonium pauperum) como: escravos, diaristas, artesãos e mendigos. Basicamente seu propósito destinava a nutrir e sepultar os pobres, órfãos, viúvas, escravos anciãos, náufragos, encarcerados ou aqueles que foram prejudicados de alguma forma pela perseguição da fé.
Em concordância com a caixa comunitária estava às coletas que servia como fundo recolhido para auxílios específicos ocorridos entre cristãos ou entre comunidades como sinal de favor e apoio em unidade. Assim ocorreu a coleta no tempo do apóstolo Paulo com assistência das igrejas de origem gentílica aos irmãos de origem judaica
1  Pois quanto à ministração que se faz a favor dos santos, não necessito escrever-vos; 2  porque bem sei a vossa prontidão, pela qual me glorio de vós perante os macedônios, dizendo que a Acaia está pronta desde o ano passado; e o vosso zelo tem estimulado muitos… 5  Portanto, julguei necessário exortar estes irmãos que fossem adiante ter convosco, e preparassem de antemão a vossa beneficência, já há tempos prometida, para que a mesma esteja pronta como beneficência e não como por extorsão. 6  Mas digo isto: Aquele que semeia pouco, pouco também ceifará; e aquele que semeia em abundância, em abundância também ceifará, 7  Cada um contribua segundo propôs no seu coração; não com tristeza, nem por constrangimento; porque Deus ama ao que dá com alegria. 8  E Deus é poderoso para fazer abundar em vós toda a graça, a fim de que, tendo sempre, em tudo, toda a suficiência, abundeis em toda boa obra; 9  conforme está escrito: Espalhou, deu aos pobres; a sua justiça permanece para sempre.
10  Ora, aquele que dá a semente ao que semeia, e pão para comer, também dará e multiplicará a vossa sementeira, e aumentará os frutos da vossa justiça. 11  enquanto em tudo enriqueceis para toda a liberalidade, a qual por nós reverte em ações de graças a Deus. 12  Porque a ministração deste serviço não só supre as necessidades dos santos, mas também transborda em muitas ações de graças a Deus; 13  visto como, na prova desta ministração, eles glorificam a Deus pela submissão que confessais quanto ao evangelho de Cristo, e pela liberalidade da vossa contribuição para eles, e para todos; 2 Co.9.1,2,5-13.
6. ÓRFÃOS E VIÚVAS.
De fato, no início da era cristã, a criança, em sentido geral, se encontrava numa situação de grande vulnerabilidade. Crianças não desejadas e as nascidas fora do matrimônio eram enjeitadas . De acordo com este costume, amplamente difundido na Grécia e no Império Romano, as crianças eram, em grande medida, descartáveis.
Evidentemente, muitas das crianças abandonadas morriam. Outras eram criadas para serem escravas. Os rapazes eventualmente eram obrigados a se tornarem gladiadores e as moças eram exploradas na prostituição.
Os órfãos, dada a sua vulnerabilidade, são recomendados ao cuidado da comunidade. A sua sobrevivência fora do cristianismo praticamente era possível apenas na prostituição ou na escravidão.
Neste contexto, a comunidade cristã, além de sustentar e educar órfãos, providenciava novos pais para órfãos cristãos . Portanto, praticava-se a diaconia da adoção. Orígenes (falecido em 253/4) foi adotado por uma mulher cristã. Também filhos de mártires foram adotados.
Mais uma categoria de pessoas que recebeu ajuda das comunidades cristãs no período da Igreja Antiga são as viúvas, por causa da sua vulnerabilidade. Elas, via de regra, são mencionadas ao lado dos órfãos.
“A religião pura e sem mácula, para com o nosso Deus e Pai, é esta: visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações e a si mesmo guardar-se incontaminado do mundo”.Tg.1. 27
7. O SEPULTAMENTO:
Outra atitude solidária assumida pelo cristianismo primitivo como um dever comunitário estava no sepultamento, a começar pelos sepultamentos cristãos, onde cristãos abastados cediam seus jazigos familiares aos irmãos na fé.
57  Ao cair da tarde, veio um homem rico de Arimatéia, chamado José, que também era discípulo de Jesus. 58  Esse foi a Pilatos e pediu o corpo de Jesus. Então Pilatos mandou que lhe fosse entregue. 59  E José, tomando o corpo, envolveu-o num pano limpo, de linho, 60  e depositou-o no seu sepulcro novo, que havia aberto em rocha; e, rodando uma grande pedra para a porta do sepulcro, retirou- se. Mt.27.57-60.
Com o tempo e em decorrência disto, esta caridade passou a abranger o sepultamento dos não-cristãos, cujos defuntos se encontravam na pobreza ou abandono. Tal postura em cuidado com os mortos se dá pelo entendimento que cada ser humano é conforme a imagem de Deus sendo, portanto, merecedor de um sepultamento digno. Depois veio também o zelo e cuidado com cemitérios e outras atitudes de respeito aos mortos cuja mentalidade cristã representa o ingresso e descanso numa vida porvir.
8. O TESTEMUNHO DA DIACONIA:
O testemunho da diaconia à sociedade se deu no início da Igreja como forma diferencial indiscutível e valorosa de evangelização e demonstração de fraternidade em fé como manifestação visível do Reino de Deus.
Tal testemunho transformador através do auxílio recíproco entre os “fiéis” e solidariedade entre os “não fiéis” chamou a atenção, admirou e impactou o mundo naquela época dando igualdade de valor aos pobres, escravos, mulheres, crianças, enfermos e excluídos. Logo, esta atitude filantrópica proporcionou mudanças significativas na forma como as pessoas tinham que lidar com o sofrimento e necessidades.

APLICAÇÃO

Particularmente fiquei muito comovido com este material, pois não imaginava a importância e poder da solidariedade como fonte de crescimento da Igreja Cristã nos primeiros séculos.
Assim faço de minhas impressões o sentimento do imperador Juliano sobre este assunto: “O êxito dos cristãos se devia a isto. Ele escreve: “Será que não entendemos que o ateísmo (= cristianismo) foi promovido de modo mais eficiente pelo humanitarismo (dos cristãos) para com os estranhos e pelos cuidados (dos cristãos) com os enterros dos mortos?”
Bem-aventurado o que acode ao necessitado; o SENHOR o livra no dia do mal. 2  O SENHOR o protege, preserva-lhe a vida e o faz feliz na terra; não o entrega à discrição dos seus inimigos. 3  O SENHOR o assiste no leito da enfermidade; na doença, tu lhe afofas a cama. Sl.41.1-3.
(UMA NOTA DE ESCLARECIMENTO QUANTO A PRÁTICA DA  I.C.A.R.)

CONCLUSÃO.

Penso que boa parte daquilo que conhecemos como extraordinário crescimento da Igreja nos primeiros séculos se deu pelo fato dos mesmos cristãos terem consciência do valor da solidariedade como forma de expressão genuína e testemunho de fé.
Cujos resultados não somente engrossou as fileiras daqueles que abraçavam uma nova postura de relacionamento com Deus, mas também de relacionamento com o próximo.

APELO.

Quantos desejam se dispor ao Senhor a fim de praticar a sua fé através do amor solidário?

Material extraído de Conteúdo: GAEDE Neto, Rodolfo. Diaconia e cuidado: testemunhos dos primeiros séculos do cristianismo, São Leopoldo, EST.